Em termos contábeis, liquidez é a velocidade e a facilidade em que você pode transformar um ativo em dinheiro sem sofrer perdas significativas no seu valor durante esse processo de conversão. Infelizmente, a liquidez é um aspecto pouco entendido no mercado e na economia, fazendo com que muitas pessoas tenham prejuízo nos seus investimentos.
Poderíamos dizer que a liquidez é um dos alicerces, junto da volatilidade, para um funcionamento mais eficiente dos mercados. Não seria exagerado dizer que não haveria civilização moderna sem liquidez. Afinal, ela garante a velocidade e a eficiência das trocas, isto é, da economia de mercado.
O dinheiro, por exemplo, é o ativo mais líquido da economia, pois ele tem aceitação universal e é utilizado para firmar contratos, pagar impostos, salários e comprar ativos. Pensar em uma sociedade sem dinheiro é o mesmo que pensar em voltar milênios no passado, quando o escambo era o sistema principal de troca.
Quais ativos são líquidos?
Você já teve que vender um carro ou algum imóvel? As dificuldades são enormes e você dificilmente vende de acordo com a “avaliação”. Isso significa que é muito difícil vender um carro pelo mesmo preço da tabela FIPE e um imóvel que teve avaliação de um corretor. O problema para isso se chama liquidez.
Imóveis, carros, maquinários industriais e coleções de obras de arte estão entre os ativos mais ilíquidos em toda a escala. No curto prazo, é muito difícil vender bens sem liquidez pelo mesmo preço que você pagou. Para conseguir vendê-los por um bom preço, será preciso esperar meses ou anos.
Por outro lado, é possível vender uma ação com rapidez com uma pequena diferença entre o preço de compra e preço de venda. Ações, commodities, criptomoedas e alguns títulos de Renda Fixa estão entre os ativos mais líquidos da economia. Por isso que em uma crise, eles são os primeiros ativos a serem vendidos, porque são fáceis de converter em dinheiro.
Os ativos seguem uma escala de menos líquidos para mais líquidos, até chegar ao dinheiro, ativo mais líquido da economia. É por isso que muitas pessoas do mercado se referem ao dinheiro como a própria liquidez.
Quando alguém diz que vai ficar “líquido”, é porque essa pessoa está vendendo seus ativos para aumentar a quantidade de dinheiro em caixa.
Riscos de um ativo não-líquido
Imagine colocar seu dinheiro em uma aplicação e não conseguir resgatá-la mesmo que esteja precisando. O nome disso é risco de liquidez. Pessoas que aplicam dinheiro em títulos de renda fixa com vencimentos longos estão sujeitas a este risco, pois o resgate do dinheiro não é imediato e pode ter perdas substanciais no valor.
Por exemplo, quem investiu em um Tesouro Direto IPCA+ 2045 irá receber a inflação do período acrescida de uma remuneração de 4,75% a.a em juros, se ficar na aplicação até o final. No entanto, ao aplicar o dinheiro, o investidor compra um título, que irá lhe garantir o direito a esta remuneração.
O problema é que o preço do título despencou nos últimos meses. Quem quiser retirar o dinheiro, deverá vendê-lo ao preço de mercado e realizar um prejuízo de mais de 30%. A perspectiva da alta de juros diminui o preço unitário de cada título. Logo, quem investiu ano passado deverá esperar até o final da aplicação (mais 25 anos).
Bancos também estão sujeitos a crise de liquidez. Isso acontece porque eles operam sob um sistema de reserva fracionária: emprestam mais dinheiro do que realmente possuem em custódia. Se o número de resgates superar o de depósitos, o risco de liquidez do banco será maior, pois faltará dinheiro para honrar os resgates.
Por isso, os Bancos Centrais injetam dinheiro no sistema monetário para garantir a liquidez e a capacidade de pagamento dos bancos privados. Em uma crise de liquidez, os bancos ficam sem capacidade de pagamento e podem ir à falência caso a situação se agrave, como aconteceu na crise de 2008, por exemplo.
Quem cria a liquidez?
Na economia, os Bancos Centrais são os principais provedores de liquidez, pois eles têm o poder de criar dinheiro e imprimir através da Casa da Moeda. Eles podem retirar e injetar liquidez no sistema monetário conforme a necessidade. Um aumento de liquidez facilita o crédito e injeta dinheiro na economia, uma restrição de liquidez “seca” o mercado de crédito e diminui a circulação de dinheiro.
Os governos utilizam os Bancos Centrais para fazer política econômica e balizar a economia de um país conforme sua necessidade. No entanto, há críticas em relação a essa forma de conduzir a economia. Os mais críticos afirmam que esse processo pode gerar distorções econômicas e inflação no longo prazo, criando bolhas e recessões mais profundas.
Nos mercados de ações, commodities e criptomoedas, há os provedores profissionais de liquidez, também conhecidos como “market makers”. Eles possuem alta capacidade financeira e operam robôs de alta frequência para criar ofertas nos livros de negociação de cada ativo.
Como consequência, eles criam a liquidez no mercado através de robôs, mas ganham com operações de spread (explorar a diferença entre compra e venda dos ativos). Em contrapartida, quem está no mercado ganha facilidade para negociar seus ativos a um preço mais atrativo.
Arbitradores e traders também têm um papel fundamental para criar liquidez.
Qual é a escala dos ativos mais líquidos e menos líquidos?
Cada investimento tem sua escala de liquidez. Conforme dito acima, depende muito das características de cada ativo.
- Poupança – Alta liquidez, é possível convertê-la imediatamente para dinheiro no mesmo dia útil. É recomendado resgatá-la após seu “aniversário” de mês.
- Imóveis – Baixíssima liquidez. É muito difícil vender um imóvel, caso precise do dinheiro com urgência, a chance de vendê-lo por um valor menor será alta.
- Renda Fixa – títulos de renda fixa com liquidez diária (Selic e CDBs) possuem alta liquidez, sendo possível resgatá-los no mesmo dia útil. Alguns títulos com prazos longos têm baixa liquidez, pois leva tempo para resgatá-los e o investidor está sujeito a perdas.
- Fundos de investimentos – a liquidez do fundo é variável. Alguns fundos levam 5 dias para sacar seu dinheiro, outros levam 30 dias úteis. Depende muito de fundo para fundo. É preciso observar os prazos.
- Ações – liquidez geralmente alta, depende do volume de negociação diário. As ações mais negociadas da bolsa possuem a maior liquidez, o que torna fácil comprar e vender a um preço justo. Ações smallcaps tendem a sofrer com falta de liquidez.
- Criptomoedas – alta liquidez. Criptomoedas como Bitcoin, Ethereum e XRP possuem boa liquidez. No entanto, criptos menores tendem a sofrer com falta de liquidez, o que torna pouco atrativo negociá-las.
- Opções – liquidez muito baixa. Opção é um derivativo utilizado para proteção ou alavancagem de investimentos em ações, commodities e criptomoedas. Muitas vezes, é necessário carregar uma opção até seu vencimento, não sendo possível vendê-la antes.
Riscos de se operar em um mercado sem liquidez
Já comentei mais acima sobre o risco de liquidez. No entanto, há outros riscos implícitos em mercados que não são líquidos. Estes riscos, por sua vez, são operacionais e podem trazer grandes prejuízos para quem não se atenta a eles.
Um mercado mais líquido, em tese, tende a ser mais eficiente e os preços são menos afetados quando há grandes compras e vendas, sendo mais fácil transformar o ativo em dinheiro em caixa.
O maior risco de se operar em mercados sem liquidez é o de manipulação. Um grande exemplo disso são criptomoedas com baixa capitalização de mercado. Elas tendem a ter baixa liquidez e podem ser manipuladas para os interesses de algum grupo de pessoas. Traders desavisados são as principais vítimas dessa prática.
Você já percebeu alguma criptomoeda que subiu 500% em um único dia? É extremamente provável que ela esteja sendo manipulada, por haver baixa liquidez. Uma casa de análise de criptomoedas pode utilizar o dinheiro que recebe de assinaturas de clientes para indicar e depois manipular a criptomoeda indicada, por exemplo.
Ela poderia fazer isso indicando uma criptomoeda XPTO de baixa liquidez e 1 semana depois comprar a mercado 1.000.000 de unidades de criptomoeda XPTO. Os investidores desavisados começariam a comprá-la, mas logo depois, a casa de análise poderia vender as mesmas criptomoedas a mercado, derrubando o preço e causando prejuízo nos investidores.
Por isso, cuidado na hora de especular em mercados que não são líquidos, os riscos são elevadíssimos.